LAMBIC, AME-A OU DEIXE-A!

LAMBIC, AME-A OU DEIXE-A!

UMA CERVEJA DE PERSONALIDADE!

Por Aline Araujo, Sommelière de Cervejas, professora e empresária com formação em administração de empresas e especialização em marketing. Mais de 10 anos de experiência no mercado de bebidas.

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Selvagem, azeda, complexa, ancestral, milenar e instigante são ótimos adjetivos para descrever uma Lambic belga, mas para ter certeza de qual deles utilizar, você precisa experimentá-las!

Qualquer cervejeiro, com o mínimo de interesse em comidas e bebidas, deve ao menos experimentar uma vez na vida as Lambics. O mestre Garrett Oliver já disse algo assim uma vez, e eu absolutamente concordo com ele!

Não existe cerveja mais intrigante do que as famigeradas Lambics belgas, sejam elas em suas versões com frutas como cerejas e framboesas, as Fruit Lambics; as luxuosas Geuze, feitas a partir de um blend de Lambics com idades e complexidades distintas; as adoçadas e delicadas Faro e até mesmo as pure Lambic, simples, porém sublimes especialidades locais, encontradas somente regionalmente e que resguardam todo o terroir da microrregião de um país que é o paraíso das cervejas por excelência, a Bélgica.

São cervejas bem ao estilo ame ou odeie, uma vez que a espinha dorsal na composição de sabor dessa categoria de cerveja é a acidez. A mesma acidez rejeitada por nosso palato pós era revolução industrial, onde os alimentos in natura foram sendo maquiavelicamente substituídos pelos industrializados, mudando radicalmente nossa percepção e aceitação da acidez na comida e consequentemente, de uma Lambic tradicional…

Bem, de fato ela pode ter seu ph próximo de um vinagre, mas tantos sabores e aromas requintados e deslumbrantes, talvez te convençam e, quem sabe após alguns goles, você caia de amores por ela, assim como eu.

MÃE DE TODAS AS CERVEJAS

Como dito, além da acidez, as Lambics carregam uma personalidade distinta, uma complexidade única, com notas aromáticas que podem remeter tanto a frutas vermelhas, brancas e cítricas, luxuriantes notas florais como rosas e lavanda e até mesmo notas como alho, cachorro molhado, cela de cavalo, couro cru, urina de gato entre outros aromas com descrições não tão animadoras.

Roda Sensorial da levedura Brettanomyces Bruxelensis

Essa farta composição de aromas, oriundos majoritariamente de uma variedade específica de levedura regional chamada Brettanomyces Bruxelensis, que dão o tom dessa majestosa cerveja ancestral belga.

Lambics também podem ser chamadas de mãe de todas as cervejas, pois o método de produção dela remonta técnicas ancestrais de produção, onde o milagre da fermentação e seu agente ativo, as leveduras, ainda eram meros desconhecidos do homem e a fermentação era obtida espontaneamente.

É assim que as grandes casas produtoras de lambic fazem esse peculiar tipo de cerveja, com as devidas adaptações, até os dias de hoje no distrito de Pajottenland ou na região do vale do rio Senne, nas redondezas de Bruxelas, na Bélgica.

D.O.C. É PARA POUCOS

Essa pequena região resguarda uma espécie de D.O.C. (Denominação de Origem Controlada) chamada de Denominação de Origem Protegida e Especialidade Regional Garantida acerca da terminologia Lambic (Ou Lambiek, no dialeto flemish).  

Vale do rio Senne

O que isso tudo quer dizer é que, assim como só podemos chamar de Champagne, produtos oriundos da microrregião de mesmo nome na França, Lambics devem ser nascidas em Pajottenland ou nas redondezas do Vale do rio Senne e produtos que utilizam da mesma técnica, mas são feitos fora desse quadrante, devem ser chamados de tipo Lambic.

A LAMBIC E O SEU DIFERENCIADO PROCESSO DE FABRICAÇÃO

Em termos de processo, a produção das Lambics preserva algumas características ímpares como a produção durante os meses mais frios do ano, evitando assim uma eventual contaminação acelerada do mosto devido as temperaturas mais quentes do verão por exemplo. Além disso, os insumos e tempo de produção diferem um pouco do processo de uma cerveja tradicional:

Os lúpulos utilizados são propositalmente envelhecidos por anos e são adicionados em quantidade massiva (até 6 x mais do que em uma receita tradicional de cerveja).  Essa prática, faz com que seu uso seja apenas funcional, ou seja, apenas as características antioxidantes e bacteriostáticas do lúpulo são mantidas com o insumo envelhecido, enquanto os óleos essenciais e boa parte do amargor são quase que totalmente perdidos nesse processo de envelhecimento e oxidação.

Cevada maltada e também o não usual trigo cru, compõe o mosto primário de quase todas as Lambics. Essa composição heterogênea, conferirá alimento para as leveduras até o final do processo fermentativo, que pode durar anos.

ECOSSISTEMA CERVEJEIRO

Na maioria dos produtores mais tradicionais, após o final da mosturação e adição dos lúpulos envelhecidos, o líquido obtido é transferido para uma tina de resfriamento e aí a magia acontece. Todos os microrganismos (leveduras e bactérias) presentes na microbiota daquela sala, impregnados na porosidade das vigas estruturais de madeira, nos tijolos da cervejaria e também no ar, entram em contato com o mosto morno e contaminam a cerveja, iniciando um processo que chamamos de fermentação espontânea.

Foto: acervo pessoal Aline Araujo / Tina de resfriamento cervejaria Boon

Após uma noite nesse processo, esse líquido é transferido para tinas de madeira onde descansará por anos antes de ser embarrilado, blendado, receber frutinhas frescas como as famosas cerejas ácidas nativas da região ou ainda framboesas ou damascos.

O resultado depois desse longo período é uma lição de paciência e resiliência, além obviamente do líquido obtido, que é verdadeiramente uma iguaria belga.

PORTIFOLIO NO BRASIL

A Bier & Wein traz para o Brasil uma das marcas mais icônicas nessa seara das Lambics tradicionais. Estamos falando da BOON, uma cervejaria familiar tocada até os dias de hoje pelo sr. Frank Boon, que eu tive o prazer de conhecer em uma visita à sua fantástica, moderna e sustentável fábrica localizada em Lembeek na Bélgica.

Foto: acervo pessoal Aline Araujo / Sr. Frank Boon me dando a honra de experimentar uma versão da Geuze Single Barrel
Black Label

A Boon faz um trabalho brilhante e é uma referência em produção de Lambics na Bélgica e no mundo. De lá saem tanto rótulos mais acessíveis sensorialmente como a Kriek Boon, uma ótima cerveja aperitivo, para ser servida numa linda taça flute e acompanhar despretensiosamente acepipes salgados ou uma sobremesa de chocolate branco, até iguarias mais complexas e sofisticadas como a edição Black Label, onde o masterblender escolhe minuciosamente as melhores cervejas que estão estagiando nos barris da adega e a partir de um cirúrgico blend, faz um envase único e safrado. O resultado é uma cerveja luxuosa e complexa, mas também equilibrada e delicada, como poucas cervejarias do estilo conseguem reproduzir.

Além disso tudo que por si só, já é incrível, a Boon ainda tem uma robusta seleção de barris de madeira onde estagiaram outras bebidas como Jerez, vinhos, Cognacs e whiskies de diversas origens e vem fazendo um trabalho singular de envelhecer seus fermentados nesses barris, que carregam sensorialmente a história da bebida que viveu ali outrora.

EXPERIÊNCIA SENSORIAL INDESCRITÍVEL

Você pode viver essa experiência de conhecer um pouco desse trabalho único adquirindo em nosso site o kit BOON Geuze Discovery Box, que contem 4 versões de cervejas envelhecidas em 4 barris diferentes, um em barris que envelheceram calvados (um destilado feito a partir de sidra de maça) da Normandia, um com vinho tinto da afamada região de Côtes du Rhône na França, um com cognac e por fim uma versão envelhecida em um barril antigo, datado de 1935, adquirido de outra cervejaria.

Degustar essas quatro cervejas lado ao lado é uma enriquecedora experiência sensorial e um excelente e divertido exercício para se fazer com um pequeno grupo de amigos, para estudo e avaliação sensorial das nuances que cada barril aportará para a cerveja da Boon, uma marca referência, mundialmente premiada, genial e que produz algumas das minhas cervejas preferidas da vida!

Você pode encontrar estas delícias da Boon e outras importadas em Confraria Paulistânia Store. Além, claro, da Paulistânia – a cerveja artesanal de São Paulo, copos, souvenirs e kits para presentes. Beba com responsabilidade!



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