PURO MALTE, SER OU NÃO SER…

PURO MALTE, SER OU NÃO SER…

Por Rodrigo Sena, jornalista, sommelier de cervejas especializado em harmonizações, técnico cervejeiro, criador de conteúdo para o youtube e o instagram @beersenses

Recebo sempre muitas dúvidas sobre cervejas de pessoas que querem conhecer mais sobre o assunto. E um dos temas recorrentes nessas perguntas é a questão do puro malte. Vejo sempre uma grande confusão com esse tema, pois, a maioria das pessoas acredita que somente cervejas puro malte são boas. Isso porque há todo um marketing voltado para isso, destacando o fato de uma cerveja ser boa por ser puro malte.

Eu sempre digo que cerveja boa e cerveja ruim é diferente da cerveja que você gosta e da cerveja que você não gosta. Não é porque sensorialmente determinada cerveja não lhe agrada que ela é uma cerveja ruim. Pra mim, cerveja ruim é cerveja mal feita, com defeitos técnicos e off-flavors. Sendo assim, não dá para julgar uma cerveja apenas pelo fato dela ser puro malte ou não.

Antes de mais nada, para que cada um possa tirar suas conclusões, é preciso entender o que é malte e qual a sua função na cerveja.

O QUE É MALTE?

malte

Malte não brota da terra, não nasce em árvore, não é colhido. Malte é o resultado de um processo bioquímico que acontece dentro de um grão quando ele é umedecido.

Lembra aquela experiência da escola quando a gente colocava um grão de feijão no algodão com água? O que acontecia com ele? Ele começava a germinar, pois é isso o que ocorre quando um grão atinge, em média, 40% de umidade. Isso porque, antes de mais nada, os grãos são sementes e sua função natural é formar uma nova planta. O grão possui um embrião dentro dele, que é ativado com água.

A umidade faz rolar uma atividade enzimática, em busca de energia para formar uma nova vida. Essas enzimas, principalmente, a alfa-amilase e a beta-amilase, serão ativadas no processo de mostura da cerveja, convertendo o amido em cadeias mais simples de açúcares, que depois serão metabolizados pelas leveduras no processo de fermentação, tornando-se álcool, CO2 e outros sub-produtos. Por isso, transformar o grão em malte é muito importante para a produção de cervejas.

Etapas de Malteação do Malte

O processo de malteação é formado por 3 etapas:

1. Maceração: os grãos são umedecidos;

2. Germinação: começa a brotar uma radícula;

3. Secagem: germinação é interrompida secando o grão.

Praticamente todo cereal pode virar malte. Mas a cevada se mostrou o cereal mais eficaz por ser de simples cultivo, por ter elevada formação de enzimas e por ter uma casca mais dura, que protege a sêmola durante todo o processo. O trigo também é bem parecido. Outros cereais, como milho ou arroz, são mais difíceis, mas também é possível fazer malte deles.

QUAL A FUNÇÃO DO MALTE NA CERVEJA?

O malte é o ingrediente responsável pela base da cerveja. É dele que vem a cor da cerveja, o corpo, o teor alcoólico, e sabores muito característicos. Durante o processo de mostura, é feita uma infusão do malte em água quente, com a temperatura controlada.

Cada faixa de temperatura da água vai ativar uma enzima diferente que irá promover a quebra das cadeias de amido em açúcares mais simples. Portanto, o mosto cervejeiro, é o resultado da conversão do amido em açúcar solubilizado na água.

Sendo assim, uma cerveja puro malte significa que a única fonte de açúcar usada foi o malte. Sim, como eu disse, isso é bom e tem suas vantagens, afinal de contas, é assim que a cerveja se formou há 9 mil anos na Mesopotâmia com os sumérios.

Processo de malteação do malte

Alguns distraídos da época esqueceram estoques de grãos ao relento. Veio uma chuva e umedeceu os grãos, que depois foram secos pelo Sol, ou seja, viraram malte sem querer. Os desavisados não se lembraram desses grãos, e eles mais uma vez tomaram chuva. Só que dessa vez, já como malte, os grãos entregaram açúcar para aquela água. Então as leveduras que estavam por ali no ar se deliciaram com um mosto docinho, fermentando a mistura. E pronto, estava feita a primeira cerveja da humanidade.

Portanto, sim, fazer uma cerveja puro malte é a forma mais tradicional que existe. Mas ao longo do tempo, com o avanço tecnológico e a descoberta da fermentação, os cervejeiros começaram a testar novas receitas, com outras fontes de açúcar, além do malte. Essas outras fontes de açúcar são chamadas de adjuntos cervejeiros.

ADJUNTOS PELO MUNDO

Monastério Corsendonk – Bélgica

Na Bélgica, dentro dos mosteiros, os monges começaram a utilizar adjuntos, como açúcar de beterraba. Fizeram até uma espécie de caramelo chamado Candy Sugar. Esses açúcares deixaram a cerveja sensorialmente diferente, com mais potência alcoólica, mas sem elevar corpo e dulçor residual.

Os estilos Dubbel, Tripel e Quadrupel, por exemplo, utilizam essas outras fontes de açúcar, ou seja, não são puro malte. A Witbier também não é puro malte, sendo feita com uma parte de trigo cru, não malteado. Mas nem por isso são cervejas ruins, muito pelo contrário.

Saiba mais sobre a CORSENDONK, UM PRAZER ABENÇOADO! e a La Trappe A CERVEJA DOS MONGES

Na França e na Espanha alguns cervejeiros começaram a testar cereais não malteados nas receitas. Até hoje existem Lagers claras muito boas, feitas nessas regiões, com arroz ou milho, o que deixa a cerveja mais leve.

Mais tarde, os americanos acabaram utilizando uma porcentagem maior de milho e arroz não malteados em suas cervejas Lagers, criando o estilo American Lager.

Cerveja Erdinger Puro Malte

Já na escola alemã, a tradicional Lei de Pureza não permite o uso de adjuntos, somente de cereais malteados.

Leia mais sobre a Erdinger em a MATURAÇÃO NOBRE BÁVARA – O SELO DA DIFERENCIAÇÃO

Portanto, só o fato de ser ou não puro malte, não significa que a cerveja é boa ou ruim, mas sim, que é uma característica do estilo a que aquela cerveja pertence.

É, como eu sempre digo, o gosto pessoal deve sempre ser respeitado. Há pessoas que gostam de American Light Lagers com bastante adjunto, mais neutras, e há pessoas que não gostam.

EXPERIMENTE E TIRE SUAS CONCLUSÕES

Quer tirar suas dúvidas e formar sua opinião na prática? Aqui no e-commerce Confraria Paulistânia Store há muitas cervejas que não são puro malte e são excelentes, como as cervejas belgas da Corsendonk ou as holandesas trapistas da La Trappe. Mas também existem ótimas cervejas alemãs puro malte, como as da Erdinger, Warsteiner e Höfbrau.

O importante é você conhecer, provar, e tirar suas próprias conclusões. Aproveite as promoções que sempre rolam aqui e tenho certeza que será uma viagem sensorial incrível! Saúde!



Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *